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quinta-feira, 30 de junho de 2016

Casa Grande & Senzala:Revisitando os dualismos...

Na opinião de Freyre, a própria arquitetura da casa-grande expressaria o modo de organização social e política do Brasil, o patriarcalismo.

Revisitando os dualismos
Gilberto Freyre (1994, p.90), que era um mestre no processo de auto-estilização, gostava de

se reconhecer como um contraditório, sendo em algumas coisas "revolucionário", noutras um "conservador". Se o próprio autor de Casa grande & senzala se define dessa maneira, não seria estranho constatar que um certo sentimento de dualidade pudesse ser encontrado em boa parte da crítica sobre o ensaísta pernambucano.

Gilberto dirá que a miscigenação não é só racial, como também cultural, e esta só será possível com a característica especial em nosso território, porque será nos trópicos. Há também na constituição da sociedade nacional um embate entre duas tendências, um princípio dual: uma “erudita” e outra “rústica”, com base patriarcal formada pela confluência da monocultura e das relações sociais, o que não acontecerá em outras conquistas portuguesas. A presença de uma sociedade sedentária que requer uma família ampliada.

Desconstruindo o discurso da democracia racial
A análise da política da memória contida em Casa grande & senzala oferece um entendimento daqueles elementos formadores do discurso da democracia racial. No entanto, como mostrarei a seguir, este estudo também ajuda a desconstruir os pressupostos do mesmo discurso e estabelecer distinções entre o que é proposto pela obra de Freyre e o que acabou por se tornar a ideologia da democracia racial. Embora texto e ideologia tenham semelhanças, não podem ser considerados idênticos.

Para Freyre – em sua abordagem sobre os negros – o chamado “racismo científico” é uma tentativa de conferir a discriminação racial um cunho legal, visando dar credibilidade ao branco. No entanto, nosso autor negará esta tese, contrariando Oliveira Viana, que propunha o branqueamento como meta para que a sociedade tivesse um reflexo político positivo, com imigração de povos adaptados ao meio e ao clima, proporcionando “caldeamentos felizes”.

Em Freyre o aparente dominado foi o dominante, em uma metamorfose dando um salto em

relação ao racismo. E é no seio da família patriarcal que se dá o amalgama das culturas: a casa-grande é o cenário político para esta realização dos “antagonismos equilibrados”. O complexo “casa-grande e senzala” é o símbolo das relações sociais. É ancorada na senzala que a casa-grande ganha força social e que irá permitir o triunfo do patriarcalismo, frente a Igreja e face ao Estado que estava além do mar.

Entretanto, na opinião de outros sociólogos contemporâneos, alguns deles ligados à esquerda do movimento negro e de uma linha mais marxista e menos culturalista, o ideal da miscigenação adquiriria uma nova roupagem na obra Casa-Grande & Senzala, passando a ser vista como mecanismo de um processo, o qual teria como fim a democracia racial (expressão usada por Gilberto Freyre só muito mais tarde).


Segundo Clóvis Moura, "Gilberto Freyre caracterizou a escravidão no Brasil como composta de senhores bons e escravos submissos". O mito do bom senhor de Freyre seria uma tentativa no sentido de interpretar as contradições do escravismo como simples episódio sem importância, e que não teria o poder de desfazer a harmonia entre exploradores e explorados durante aquele período.

Afirma que historicamente a miscigenação de raças no Brasil
“nunca foi tratada e

nunca existiu como um processo livre, espontâneo, e, portanto, natural, de união entre dois povos.” Ao contrário, como reafirma Silva, a dignidade da mulher negra teria sido violentada, atingindo sua honra no âmbito moral e sexual, através de uniões mantidas a força, sob a égide do medo, da insegurança, onde as crianças eram concebidas legalmente sem pai, permanecendo no status de escrava, não havendo assim nenhum enriquecimento
racial e cultural de civilização alguma. Conclui dizendo que é preciso que não se confunda a descaracterização de um povo pela violência sexual com a hipótese de uma democracia racial.
O próprio Freyre, na obra em apreço, corrobora essa violência, embora um tanto acanhadamente:«Nenhuma casa-grande do tempo da escravidão quis para si a glória de conservar filhos maricas ou donzelões. O folclore da nossa antiga zona de engenhos de cana e de fazendas de café, quando se refere a rapaz donzelo, é sempre em tom de debique:para levar o maricas ao ridículo. O que sempre se apreciou foi o menino que cedo estivesse metido com raparigas. Raparigueiro, como ainda hoje se diz. Femeeiro. Deflorador de mocinhas. E que não tardasse a emprenhar negras, aumentando o rebanho e o capital paternos»(p.356)

A aparente ‘harmonia entre as raças’ existe em conseqüência de que, nos Estados Unidos, não existe, como no Brasil, essa intensa miscigenação, [grifo meu] que caracteriza os brasileiros. Estes fatos parecem confirmar a idéia de que as relações raciais no Brasil são pacíficas e igualitárias. Ao acreditarmos nisso, porém, caímos na chamada ‘armadilha ideológica’: enxergar somente o que julgamos ou queremos ver, e não aquilo que está diante de nossos olhos. Qualquer análise detida, fundada em índices sociais ou na simples observação de nossos costumes revela a triste verdade: sob a máscara da cordialidade existe uma socie dade racista. (...) Portanto, as contradições do ‘mito da democracia racial’ podem ser constatadas simplesmente através da análise da realidade brasileira”

É comum, nas comparações entre os quadros das relações raciais nos Estados Unidos e no Brasil, se colocar o seguinte: o colonizador português se dignou misturar-se com negros e índios, por sua formação católica, seu caráter latino, a falta de mulheres européias, a maior proporção de escravos; nos Estados Unidos a figura do mestiço seria pouco relevante na medida em que a formação protestante não permitia ao branco reconhecer sua paternidade ao filho mestiço.

-O autor, de forma mais objetiva, não profliga a promiscuidade reinante no período escravocrata.

Mais incisivo é Sergius Gonzaga:"Filhos, quase todos, de senhores de engenho, tinham à disposição o corpo das escravas — tidas como coisas, e assim obrigadas a aceitar o furor sexual dos grandes proprietários e seus descendentes. Algumas delas requintavam a sensualidade, buscando fugir à brutalidade do trabalho servil pelo reconhecimento de um senhor mais generoso"
o “mito da democracia racial” e a visão preconceituosa sobre a população negra, são reproduzidos pelo sistema de ensino através dos currículos escolares e livros didáticos,
professores da rede pública e privada em qualquer nível de ensino, nos meios de comunicação social (rádio, televisão, imprensa escrita), na produção editorial (livros e revistas), por artistas, intelectuais, escritores, jornalistas, editores, profissionais liberais, lideranças políticas, populares e sindicais, nas mais diversas organizações e instituições governamentais e da sociedade civil – das igrejas aos partidos políticos.

O processo de alienação da criança brasileira se faz sobretudo através da escola, onde se dá o reforço de um conjunto de idéias elitistas que distorce os valores culturais e nega a participação dos oprimidos no processo histórico brasileiro. Ora, um povo que não sabe do seu passado, um povo sem história, não pode visualizar os caminhos a empreender ao seu futuro.

No caso da criança negra, é justamente na escola que se dá a quebra de sua estrutura psicológica, emocional e cultural através da internalização da ideologia do branqueamento, do mito do brasileiro cordial e do mito da democracia racial. (grifo meu) No final desse processo se ela não reage, aça ba por envergonhar das suas origens e da sua condição de negro.

É nessa re-configuração das relações raciais que aparecem os ideólogos da miscigenação, com Gilberto Freyre [grifo meu] no Brasil substituindo a Euclides da Cunha e sua tese de degenerescência das raças por via das misturas. O mestiço torna-se uma figura mitológica importante na manutenção de um sistema sócio-econômico de dominação de uma raça sobre outra, sem que as tensões sociais daí derivadas possam emergir em termos de confronto racial.
Para tanto, os dispositivos de reconhecimento de traços biológicos e culturais passam a funcionar em dois níveis: ao nível sócio-econômico os dispositivos reconhecem e segregam o negro; ao nível ideológico forjam e ostentam a figura do mestiço. Signo de um trânsito biológico, ele simboliza a chegada da ‘democracia racial’, [grifo meu] ao nível biológico e afirma a própria impossibilidade da segregação a nível sócio-econômico. Na indistinção da mestiçagem como poderia haver segregação racial?


As estatísticas transformam o mito em ideologia por meio da categoria pardo. Uma categoria ideológica operacionalizada a nível científico divide uma raça (categoria histórica e sociologicamente pertinente): ao nível das sutilezas bio-ideológicas a raça negra é dividida em negros e pardos. A máquina de segregação de raças só fabrica pardos no nível ideológico. No nível sócio - econômico, todos são reconhecidos e esmagados enquanto negros.”

Por outro lado, é importante ressaltar que esses processos se reforçam, também a nível universitário.”

É necessário um novo olhar sob a ótica do população negra, uma “nova” interpretação da história do Brasil. A partir de estudos e pesquisas, da denúncia, da sensibilização de segmentos sociais organizados, o Movimento Negro fomentou um intenso debate entre intelectuais, pesquisadores, artistas, dirigentes políticos e lideranças populares, desenvolvendo uma análise crítica profunda da realidade histórica e social da população negra.

A Casa Grande Surta Quando a Senzala Aprende a Ler.
Mesmo diante das condições mais adversas e com extremas dificuldades em termos de recursos materiais, humanos e institucionais, o conjunto da militância do Movimento Negro desenvolveu um intenso o trabalho de mobilização no combate ao racismo, tendo um peso decisivo na desconstrução do mito da “democracia racial”

Assim também é quando sincretizamos a questão com as classes sociais. Mas ainda assim, pessoas negras continuam em desvantagem, pois representamos o maior contingente entre as classes C e D. Mas há quem afirme que o problema do Brasil é de classe, ignorando completamente que a raça é formada e dividida por classes sociais e vice-versa.
O Brasil  e um país racista, como tenta de todas as maneiras dizer para si mesmo, cotas não seriam motivo de discussão. Seria fato consumado. Mas a segunda nação mais negra do mundo deveria sentir vergonha da maneira covarde com que trata os seus filhos.
Pessoas negras não são vitimistas; pessoas brancas é que são, porque choram por medo de perder privilégios mais que consolidados de menoreia dominante. E  não querem nem pensar em repartir.


Um afro abraço.

Claudia Vitalino.


fonte:www.scielo.br/meuartigo.brasilescola.uol.com.br/www.ibamendes.com/

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